As mudanças impostas pela quarentena impactaram os hábitos da família em todos os sentidos: rotina escolar dos filhos, horários de sono e de trabalho dos pais e, consequentemente, a rotina alimentar da casa.
O que parecia provisório tem se estendido ao longo dos últimos meses e as consequências para a saúde das crianças estão vindo à tona. Queixas como ganho de peso e mudança nos hábitos de higiene e saúde oral vêm crescendo e ganhando espaço nas famílias.
Os pais deixaram de fazer algumas refeições nos locais habituais e os filhos deixaram de receber alimentação no berçário, creche ou escola, sendo criada uma nova rotina de compra, preparo e oferta dos alimentos.
O confinamento proporcionou maior convivência doméstica e permitiu que os pais conhecessem melhor os hábitos alimentares de seus filhos; com o surgimento de tarefas associadas à compra, preparo e consumo alimentar e aumento das refeições em família.
Em paralelo, a quarentena colocou as crianças frente a frente com uma nova situação, despertando sentimentos como ansiedade, tédio, mudanças de humor e solidão (pela falta das atividades escolares e físicas, dos amiguinhos e dos pais, que estão “presentes”, mas trabalhando em casa). Em muitos casos, houve mudança total da rotina diária e dos cuidados com as crianças.
A criança ainda não possui conhecimento e autonomia para escolher o que é bom e necessário para o seu corpo e, nos momentos de alteração de humor, pode acabar procurando alívio no alimento. Nessas situações, é essencial que pais e cuidadores ajudem a criança a sair do “comer automático”, orientando-a na identificação de quando ela está sentindo fome e quando está saciada.
Os alimentos disponíveis em casa muitas vezes passaram a servir de conforto e companhia, especialmente os ultraprocessados, caracterizados por alto apelo sensorial, praticidade, disponibilidade, durabilidade e alto teor energético. Dentre eles, destacam-se as bolachas, salgadinhos, sucos prontos, doces, chocolate, congelados, macarrão instantâneo, pipoca de micro-ondas, bolos prontos e guloseimas em geral.
Sua fácil aceitação e consumo exagerado estão associados a altos teores de gordura + açúcar ou gordura + sal, que realçam os sabores; além de baixa demanda mastigatória e embalagens práticas e sedutoras, que favorecem o consumo a qualquer hora e local.
O consumo regular desses alimentos predispõe crianças a um risco maior para excesso de peso, desenvolvimento da cárie dentária e da erosão dental. Atitudes simples como deixar fácil acesso à criança uma fruta cortada, picada ou descascada podem facilitar seu consumo e resgatar um hábito saudável.
A importância da rotina para a saúde oral
Nesse período é essencial que a família estabeleça uma rotina para as crianças, incluindo horários regulares de alimentação, sono, estudo, higiene pessoal e atividade física. A criança precisa de modelos alimentares e os pais devem assumir esse papel, valorizando os momentos da refeição, sentando à mesa com acolhimento, num ambiente saudável, com uma boa apresentação dos pratos, tempo para uma mastigação adequada, conversas leves, sem cobranças e presença de TV e outras telas que possam distrair a todos. A afetividade e cuidado dos pais são essenciais no processo da alimentação infantil, assim como a manutenção dos hábitos de higiene oral, que ao final constituem-se em cuidados importantes, traduzidos como atos de amor para com as crianças.
A pandemia trouxe muitos desafios para as famílias. No início, tudo parecia difícil ou até impossível. A convivência no mesmo ambiente 24 horas por dia exige muito diálogo e criatividade e aos poucos as coisas vêm se acomodando. As famílias terão muito aprendizado com essa experiência ímpar na história da humanidade.
Fonte: Grupo de Saúde Oral da Sociedade de Pediatria de São Paulo